Nota em defesa da Lei 13.465/2017 – Regularização Fundiária

Foto: Divulgação/ Governo de Tocantins

Acerca da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) contra a Lei 13.465/2017 proposta pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil, em tramitação no Superior Tribunal Federal (STF), com Parecer favorável do Ministério Público Federal, a Associação Brasileira de Cohabs e Agentes Públicos de Habitação (ABC), vem manifestar a preocupação com os rumos que o processo de regularização fundiária no Brasil possa tomar caso a referida ação tenha êxito.

Ressalta-se o aspecto positivo no que se refere ao fato do Ministro Relator Luiz Fux ter negado a Medida Liminar para suspender os efeitos da referida lei, ainda no ano passado, mantendo a sua vigência e eficácia, o que possibilitou o avanço do processo em todo o país.

Sem a pretensão de adentrar no mérito jurídico das alegações, os quais foram amplamente expostos e contraditados pelo então Ministério das Cidades e pela Advocacia Geral da União (AGU), manifestamos estranheza com algumas alegações dos autores da ADIN de que o novo diploma legal estaria confrontando o modelo constitucional de política urbana, que atribui aos municípios a competência para legislar sobre assuntos de interesse local e sobre o adequado ordenamento territorial. Pelo contrário, a Lei 13.465/2017 destrava a ação dos municípios para implementar os projetos de regularização, que somente podem ser concretizados com a ação e as aprovações dos gestores municipais.

Como bem frisado pela AGU, “a fixação de instrumentos da política urbana por legislação federal, por se tratar de regras de Direito Urbanístico, não ofende competência legislativa municipal, haja vista que esta se limita à suplementação da legislação federal ou estadual sobre o assunto. Ou seja, os dispositivos previstos na lei ‘encontram-se no âmbito da competência legislativa da União, uma vez que tratam de normas gerais sobre urbanístico que visa, em verdade, criar novos instrumentos da política urbana, bem como uniformizar os procedimentos em relação a tais institutos, sem, contudo, afetar a competência executiva municipal em relação ao tema”.

A preocupação da ABC, na condição de entidade nacional que congrega e representa o setor público de estados e municípios que operam o processo de regularização fundiária, é com as consequências sociais e econômicas que a interrupção do processo pode trazer. Até porque, ao atacar a Lei 13.465/2017, os autores da ADIN apontam muitos dispositivos da Lei 11.977/2009, que foram reproduzidos no novo diploma legal. Se tiver êxito, voltaremos à situação anterior vigente há 10 anos atras, quando não se conseguia regularizar nenhum núcleo urbano ou rural no Brasil por falta de instrumento jurídico.

 Na verdade, a Lei 11.977, que teve indiscutível mérito quando da sua edição, tornou-se insuficiente para enfrentar os grandes problemas da irregularidade urbana e rural. Graças a nova lei, milhões de imóveis irregulares poderão ser integrados à economia formal, poderão gerar renda, patrimônio efetivo, urbanização e valorização. Tudo isso movimenta a economia e os efeitos sociais são notórios. A Lei 13.465/ 2017 cria instrumentos e estabelece procedimentos que garantem aos municípios uma maior autonomia nos processos de regularização que tem o mérito de constituir-se como um processo indutor das ações de desenvolvimento econômico, social e de ordenação do espaço urbano com sustentabilidade fiscal.

 Por outro lado, a impossibilidade de utilização dos instrumentos da Lei 13.465/17 causaria um grande impacto negativo, principalmente para a população de baixa renda, que necessita do título de propriedade de seu imóvel para se inserir na cidade formal, constituindo elemento de cidadania das pessoas.

Segundo dados do Ministério das Cidades, estima-se que ao menos 50% das propriedades imobiliárias urbanas no país apresentam algum tipo de irregularidade, o que resultaria em aproximadamente 100 milhões de pessoas morando em imóveis irregulares. Estima-se que desde a publicação da lei, em julho de 2017, cerca de 200 mil imóveis foram regularizados nos estados e municípios. Como exemplos, a nova legislação destravou a titulação de mais de 18.000 imóveis no Pará, 3.000 no Rio Grande do Norte, 100.000 no Estado de São Paulo e tantos outros nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Pernambuco, Amazonas e Rondônia, Mato Grosso do Sul, além de outros que já estão utilizando as novas normas e instrumentos trazidos pela nova legislação.

Descata-se também potencial de arrecadação é um dos benefícios que a regularização proporciona aos municípios, e também para a comunidade, uma vez que os municípios terão mais recursos para investir em serviços públicos, obras, saneamento, mobilidade, pavimentação, entre outros.

Quando os moradores não possuem os direitos de propriedade de seus imóveis a tendência é que invistam menos na melhoria de habitabilidade e conservação. Por sua vez, o poder público também reduz o investimento e com isso a comunidade tem dificuldades, por exemplo, na mobilidade urbana, bem como a falta de infraestrutura e de equipamentos urbanos.

Além de gerar ônus financeiros ao Poder Público, a irregularidade dificulta o acesso a informações e dados para a elaboração de políticas sociais, urbanísticas e ambientais, agravando a perda de receitas. Com a  regularização fundiária as famílias ganham um endereço, segurança jurídica e estimulo para investir na sua propriedade. Os imóveis podem ser usados como garantia para a obtenção de créditos e financiamentos, e a integração do proprietário ao sistema econômico. E consequentemente há o aumento na geração de empregos e aquecimento da economia.

 Correção de problemas do PAC

Por paradoxal que possa parecer, a mesma lei do MCMV que institui os primeiros mecanismos de regularização fundiária, não conseguiu resolver problemas de outro importante programa governamental da época, as obras do Plano de Aceleração do Crescimento – PAC, que envolve a construção de moradias.

De acordo com o relatório da Caixa Econômica Federal de dezembro de 2017, que foi encaminhado ao grupo de trabalho de regularização fundiária, criado através da Portaria nº 326 de 17/07/2016, do qual a ABC fez parte, mais de 744 mil lotes destinados ao PAC ainda estavam irregulares, dos quais mais de 109 mil já com as obras físicas concluídas, mas pendente de regularização.

Os principais problemas levantados pelo referido relatório em relação a irregularidade fundiária dos empreendimentos referem-se a: a) Dificuldade para desapropriação dos terrenos (lotes particulares, patrimônio da União); b) Morosidade nos cartórios para entrega dos títulos registrados; c) Ocorrências não sanadas durante o processo de regularização fundiária: d) transmissão de posse, existência de lotes vazios, documentação das famílias, morte dos titulares, recusa das famílias. e) Dificuldade para elaboração do plano/projeto de regularização fundiária; f) Falta de recursos e equipe capacitada para realização de levantamento topográfico e cadastramento socioeconômico.

Grande parte desses problemas não encontrou solução na lei anterior e podem ser resolvidos com os instrumentos trazidos pela Lei 13.465/2017.