Julgamento vem sendo realizado no STF e alteração vai afetar os novos contratos, bem como os antigos que ficarão mais caros
Caso a decisão final do STF (Supremo Tribunal Federal) declare a inconstitucionalidade da TR (Taxa Referencial) como índice de remuneração do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e sua substituição por outro indicador isso vai encarecer os empréstimos já concedidos para a aquisição da casa própria.
Os contratos de financiamento com recursos do fundo costumam ter uma cláusula determinando que a atualização do saldo devedor ocorre mensalmente “pelo mesmo coeficiente de atualização aplicável às contas vinculadas do FGTS”.
Caso ocorra uma mudança para a TR ou outro indicador escolhido pelo tribunal os contratos já assinados e em fase de amortização ficarão mais caros.
A AGU (Advocacia-Geral da União) informou que “as áreas técnicas do governo irão realizar novos cálculos e estimativas de impacto do julgamento, os quais se encontram em andamento, a fim de se avaliar os cenários de possíveis impactos”. A Caixa não respondeu aos questionamentos.
Até agora, o ministro Luís Roberto Barroso votou pela substituição da TR pelo rendimento da poupança na remuneração dos recursos depositados no FGTS. Ele foi seguido pelo ministro André Mendonça. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Kassio Nunes. A poupança paga atualmente 6,17% ao ano mais TR. Hoje, o FGTS rende 3% ao ano mais TR, que tem ficado próxima de zero.
Além disso as contas também recebem a remuneração das aplicações que o Fundo faz no mercado financeiro e que, até pode igualar-se ao rendimento da poupança.
PREJUDICADOS.
Caso ocorra uma mudança do FGTS não seriam somente os novos empréstimos concedidos que podem ficar mais caros, mas também os antigos. Isso pode atingir até contratos firmados em outras décadas, já que financiamentos habitacionais se estendem por até 35 anos.
Isso iria refletir de forma direta e negativa para as pessoas de renda mais baixa, que são aquelas que fazem financiamento direto com o FGTS. O fundo empresta recursos principalmente para famílias com renda bruta mensal de até R$ 9.000.
O deputado federal Fernando Marangoni (União Brasil-SP), relator da MP (Medida Provisória) que recria o programa Minha Casa, Minha Vida, demonstrou temor com a mudança.
“Há uma argumentação falaciosa de que [o aumento da remuneração] está ajudando o cotista sendo que, no fim do dia, estou excluindo ele das políticas públicas. É como se estivesse dando R$ 1 no bolso esquerdo e tirando R$ 5 do direito”, avaliou. Essa mudança levaria a uma alta dos juros, excluindo quem tem renda mais baixa de conseguir financiamento no FGTS.
O senador Eduardo Braga (MDB), que preside a comissão mista que analisa a recriação do Minha Casa, Minha Vida, foi na mesma linha. Para ele, o programa habitacional corre risco a partir da decisão do STF.
“Os que têm menos renda não vão conseguir acessar financiamento. Nosso trabalho de priorizar a faixa 1 do Minha Casa Minha Vida [famílias com renda mensal de até R$ 2.640] pode ser penalizado por uma coisa que não está na MP e é fundamental”, opinou.
SANEAMENTO.
Não só a habitação deve ser impactada. O saneamento é o segundo maior destinatário de financiamentos do FGTS.
O presidente da Sanasa, empresa municipal de saneamento de Campinas, Manuelito Magalhães Junior, avalia que “os contratos são atos jurídicos perfeitos. A lei não poderia retroagir para prejudicar uma das partes”.
“Os contratos de financiamento entre o banco e a concessionária de saneamento também têm por trás contratos de empréstimo entre o FGTS e o agente financeiro. Teria que retroagir esse contrato também”, apontou.
O julgamento foi interrompido após um pedido de vista do ministro Kassio Nunes. Com esta decisão o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), acredita que haverá mais tempo para o governo federal calcular o impacto da possível decisão da corte constitucional.
“Descasar o ativo e o passivo do fundo vai gerar um problema difícil de solucionar porque é um fundo muito grande. Estamos falando de centenas de bilhões de reais”, disse.
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, minimizou os efeitos do julgamento. “Evidentemente que tem avaliações mais catastrofistas, mas a priori não compromete o fundo”, disse à Folha.
Marinho afirmou que o FGTS já vem pagando acima da poupança desde que começou a compartilhar os lucros com os trabalhadores (em 2017) e defendeu manter as regras atuais de remuneração, mas disse que o governo vai “cumprir a decisão que o Supremo tomar, evidentemente”.
Link para matéria da Folha: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/05/mudanca-no-fgts-pode-gerar-efeito-cascata-e-encarecer-financiamento-de-imoveis.shtml