Comissão de Política Urbana tem organizado audiências regionais, temáticas e gerais com o objetivo de ouvir as demandas da população, contribuições de parlamentares e conhecer os ajustes necessários
A quinta audiência pública da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente para discutir a revisão do PDE (Plano Diretor Estratégico) foi realizada na Câmara de São Paulo, na terça-feira. Vereadores e representantes do governo e da sociedade civil debateram as ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social).
Essas áreas demarcadas na cidade são utilizadas para a instalação de moradias destinadas às famílias de baixa renda. São territórios que além de habitação popular, passam por melhorias urbanísticas, regularização fundiária e recuperação ambiental. Estas regiões também recebem infraestrutura e equipamentos públicos, promovendo o desenvolvimento local.
A Comissão de Política Urbana tem organizado audiências regionais, temáticas e gerais com o objetivo de ouvir as demandas da população, contribuições de parlamentares e conhecer os ajustes propostos pela prefeitura para o Plano Diretor. O texto da revisão está no projeto de lei 127/2023.
Ao todo, o governo municipal prevê o aprimoramento de 75 artigos da atual legislação do PDE – a Lei n° 16.050, de 31 de julho de 2014. Executivo e Legislativo têm reiterado nas audiências que a regulamentação em vigor tem validade até 2029, quando então será elaborado um novo PDE. Outra ressalva é de que os ajustes necessários seguem as diretrizes determinadas na norma vigente.
O debate da audiência foi intermediado pelo presidente da Comissão de Política Urbana, o vereador Rubinho Nunes (União). “O nosso relator, bem como os demais vereadores da Comissão, têm tomado nota de todos os apontamentos que vêm sendo feitos para construirmos o melhor texto e que possamos atender ao máximo aos anseios da população”, explicou.
Relator do PDE e membro do colegiado, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) disse que as Zonas Especiais de Interesse Social estão entre as prioridades do Plano Diretor. De acordo com Goulart, o tema das ZEIS “é um dos conceitos básicos da lei e desta revisão”.
O parlamentar contou ainda que quer integrar os programas habitacionais, como o Pode Entrar, por exemplo, a fim de fortalecer a construção de unidades de moradia popular. “Muito se disse aqui em aumentar a demarcação, aumentar o número de ZEIS, transformar área ambiental. Mas todos os pedidos aqui levam ao que este relator tem pensado, que é a entrega efetiva das unidades habitacionais”, explicou.
Integrante da Comissão, o líder do governo na Câmara, vereador Fabio Riva (PSDB), também fez considerações sobre o tema da audiência. Um dos pontos tratados por ele sugere fazer mais demarcações de ZEIS na cidade, desde que não sejam em áreas de Zepam (Zona Especial de Proteção Ambiental).
“Quero deixar muito claro aqui a questão da preocupação com a Zepam. Mas existem outras áreas que podem ter esta alteração na Lei de Zoneamento, inclusive para as ZEIS, porque perderam toda a sua característica vocacional da demarcação que foi feita na Lei de Zoneamento, em 2016, e pelo próprio Plano Diretor, em 2014”, disse o parlamentar.
Fabio Riva também falou da possibilidade de aumentar em 50% o coeficiente de aproveitamento das ZEIS, o que permite ampliar os metros quadrados construídos em um terreno. “Passando de fator 4 para 6 conseguimos de uma forma e de outra contemplar mais unidades habitacionais e atender às pessoas que mais precisam”.
O vereador Sansão Pereira (Republicanos), membro da Comissão, também defende o aumento do coeficiente de aproveitamento em 50% nas regiões de ZEIS. “Em um prédio de seis ou oito andares, a construtora vai poder implantar 10, 12 andares. Vai compensar 50% a mais, assim dando uma melhor condição”.
Outra integrante do colegiado, a vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL) considera o tema das ZEIS como o principal item da revisão do PDE. Para a parlamentar, a demarcação das Zonas Especiais de Interesse Social é fundamental para que ocorra a regularização fundiária e a urbanização destas áreas. “Essa população precisa dessa demarcação das ZEIS para que haja o mínimo de justiça habitacional, de justiça geográfica aqui na cidade de São Paulo”m, comentou.
Segundo Silvia, há na capital paulista 2.442 perímetros demarcados como ZEIS. Ela levantou a informação para contrariar o artigo 48 do PDE, que prevê regulamentar o funcionamento dos Conselhos Gestores de Zonas Especiais de Interesse Social por meio de decreto do governo municipal.
“Precisamos garantir que os Conselhos Gestores tenham em todos os perímetros demarcados, porque eles vão garantir que não haja remoção forçada, que essa população permaneça naquele lugar”, disse Silvia.
O vereador Alessandro Guedes (PT) não faz parte da comissão, porém subiu à tribuna para contribuir com o debate. Segundo ele, o PDE tem que priorizar a regularização fundiária. “A discussão de ZEIS passa por não reduzir nenhuma área de ZEIS na cidade. Pelo contrário, nós temos que aumentar”, definiu o parlamentar.
Também participaram da audiência o vice-presidente da Comissão de Política Urbana, vereador Marlon Luz (MDB) e o vereador Arselino Tatto (PT), integrante do colegiado. Além deles registraram presença os vereadores Atílio Francisco (Repúblicanos), João Ananias (PT) e Rodolfo Despachante (PSC).
EXECUTIVO
Guilherme Brito, da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento, representou a prefeitura. Ele explicou como foi desenvolvido o projeto de lei que propõe os ajustes ao PDE. Brito fez uma introdução, apresentou detalhes de cada uma das três etapas do plano e do processo participativo, que contribuiu com 4.388 sugestões.
De acordo com Guilherme, no fim da elaboração do projeto, em março deste ano, foram configurados 22 relatórios temáticos e uma minuta do projeto de lei. O representante da Secretaria de Urbanismo também tratou especificamente do tema da audiência.
Além de detalhar alguns artigos, Guilherme falou que a revisão do PDE “indica a necessidade de elaboração do plano de reassentamento para famílias removidas e prevê atendimento prioritário para os residentes em cortiços e ocupações irregulares afetadas”.
Ele disse ainda que entre os ajustes do Plano Diretor prevê o aumento do coeficiente de aproveitamento máximo em 50% para o licenciamento de empreendimentos em áreas específicas de ZEIS. “Em áreas que estão em torno do metrô e dos corredores de ônibus pode haver o aumento deste coeficiente, permitindo assim a produção de mais unidades habitacionais”, comparou.
O defensor público Allan Ramalho Ferreira participou da audiência. Ele afirmou que a Defensoria Pública produziu uma nota técnica junto ao projeto para demonstrar algumas preocupações com a proposta de revisão do PDE. “A revisão intermediária, no entender da Defensoria Pública, propõe o enfraquecimento das Zonas Especiais de Interesse Social. Elas são instrumentos urbanísticos que demarcam o território e destinam esse território preponderantemente para o atendimento da população de baixa renda”, comentou Ramalho Ferreira.
Ele também fez observações quanto à forma de regulamentação dos Conselhos Gestores de ZEIS. Segundo o defensor, o projeto “descaracteriza a obrigatoriedade de formação de Conselho Gestor. Isso porque pela redação do Plano Diretor hoje não há dúvida que esta Constituição é obrigatória, e esta obrigatoriedade é respaldada e chancelada por muitas decisões judiciais em primeira e segunda instâncias que a própria Defensoria e a advocacia popular conseguem para neutralizar ameaças de remoção da população moradora das ZEIS”.
Um dos principais objetivos das audiências públicas é ouvir a população. Por isso, a comissão recebeu moradores e representantes de movimentos sociais. Marcos Miguel dos Anjos falou em nome do Colégio Doutor Walter Belian, localizado no Cambuci, região central da cidade. Ele disse que a escola está em uma área de ZEI, e com isso não pode realizar obras para ampliar o atendimento de crianças carentes da região.
“Com uma área de interesse social, o colégio não consegue fazer investimentos para ampliar as instalações e as salas de aula”, disse Marcos.
O morador Fernando Escudero apresentou uma proposta para beneficiar as famílias de baixa renda que não conseguem financiar a compra de imóveis sociais. “Seria interessante deixar claro que o aluguel é sim uma opção de destinação, ou seja, é possível que se construa habitação de interesse social para que o proprietário alugue estas unidades para a população carente. Isso vai facilitar o acesso. Seria interessante regulamentar o valor deste aluguel”, explicou.
Representando a região do Sabará, zona sul da cidade, Fayes Mohamad Rabah pede atenção para o bairro. “Tem um projeto que prevê 500 desapropriações sem um plano de bairro, qual o impacto que isso vai trazer para os moradores locais?”, questionou.
Para o urbanista Kazuo Nakano é essencial ampliar a discussão sobre o adensamento populacional previsto na revisão do PDE. “Quando esses conjuntos habitacionais chegam próximo ao coeficiente 4, o adensamento chega em torno de duas mil, três mil unidades habitacionais por hectare. É um adensamento altíssimo, que se não tiver controle da qualidade do empreendimento vai prejudicar a classe trabalhadora”.
Moradora da Bela Vista, região central da cidade, Inês Lucchesi também falou sobre o adensamento, porém na região central. “Aqui na Bela Vista houve um adensamento dos cortiços. Acho que as áreas de ZEIS 3 têm que ser ampliadas”, disse. As ZEIS 3 são áreas com imóveis ociosos, galpões abandonados, deteriorados, cortiços, e em locais com oferta de infraestrutura.
Já João Afif Acras, morador do Cambuci, contou que nos próximos quatro anos está prevista a construção de 47 novos prédios na região. “A nossa infraestrutura não aguenta isso. Temos um terreno de 165 mil metros quadrados, onde era a antiga Enel, que vai subir 35 torres. O bairro não suporta”, desabafou.
Ciléia dos Santos cobrou moradia para as famílias com renda mensal de até três salários mínimos. “As ZEIS deveriam ser prioridade para este público, pensando que direcioná-las para a população de classe média só vai favorecer as construtoras”.
Outra moradora da capital que defende priorizar as ZEIS para habitações populares é Mara Souza. Segundo ela, o custo dos imóveis é muito alto para a realidade das pessoas que precisam de moradia. “Não é um preço popular. Não fazem apartamentos com 30 metros quadrados para vender para a população de baixa renda com preço acessível. A população que ganha até um salário mínimo e meio ainda não pode pagar os valores dos imóveis entre R$ 200 mil e R$ 250 mil”, citou.
A Câmara de São Paulo disponibiliza um hotsite da revisão do Plano Diretor Estratégico. Nele, a população encontra informações do PDE, informações das audiências públicas realizadas, além das datas, horários e local das próximas discussões. No hotsite, as pessoas também podem contribuir com sugestões preenchendo um formulário digital.
Por: Marco Calejo