A Cury Construtora e a MRV Engenharia focadas na baixa renda começam a mudar a forma de vender seus imóveis. No novo modelo, que será implantado gradualmente, as duas incorporadoras consideram que uma unidade foi vendida apenas no momento em que o cliente obtém o financiamento pela Caixa Econômica Federal.
Com a mudança, a venda leva mais tempo para ser registrada, resultando em queda inicial do volume comercializado. Por outro lado, o modelo elimina risco de distratos, porque atrela a venda ao repasse para o banco do que a companhia tem a receber do cliente.
Nos últimos anos, incorporadoras com atuação no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida adotaram sistema de comercialização chamado SICAQ/SAC, em que a venda é registrada quando, na assinatura do contrato, o crédito do comprador é aprovado pela instituição financeira.
No segmento de baixa renda, a modalidade contribuiu para redução expressiva dos distratos, mas não impediu rescisões. No intervalo entre a aprovação e a assinatura do financiamento do cliente com o banco de 90 a 180 dias ainda podem ocorrer distratos, por exemplo, provocado pela demissão do comprador é demitido ou aumento na taxa de juros.
A Cury incorporadora da qual a Cyrela tem 50% de participação deu início, em janeiro, à utilização de novo modelo, chamado pela companhia de “venda definitiva”, em lançamento realizado em São Gonçalo (RJ). A incorporadora está migrando outros empreendimentos do Estado do Rio de Janeiro para o novo formato e lançou, na semana passada, projeto em São Paulo nessa modalidade. Há expectativa que a mudança de todos os empreendimentos para a “venda definitiva” seja concluída até o segundo semestre.
Segundo o presidente da Cury, Fabio Cury, a metodologia desenvolvida pela incorporadora possibilita que o prazo máximo entre o pedido à Caixa de financiamento do cliente feito na sequência da definição da compra , e a liberação do crédito seja de 15 dias, em caso de uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). “Sem o FGTS, o prazo é de sete dias”, afirma Cury.
No modelo tradicional, o prazo para o banco conceder o financiamento chegou a seis meses, no ano passado, segundo o presidente da Cury, o que levou à perda de 40% das vendas fechadas. De acordo com o executivo, a empresa perde velocidade de vendas com o novo formato, mas ganha qualidade nas operações fechadas. “Vamos registrar menos vendas, mas somente aquelas que ocorrerem de verdade”, afirma o presidente da Cury.
Para que a venda definitiva seja possível em até 15 dias, o comprador de um imóvel da Cury precisa apresentar, na escolha da unidade, todos os documentos solicitados pela Caixa para financiar a aquisição. Outra mudança é que o corretor responsável pela venda passa a receber a comissão apenas quando o repasse ocorre, o que faz com que esse profissional participe mais do processo de cobrança ao banco da execução das etapas necessárias para o financiamento, segundo Cury.
No modelo tradicional, o corretor recebe metade da comissão no ato da venda e o restante após o financiamento bancário.
A MRV também começou a adotar, no primeiro trimestre, a modalidade, que chama de “venda garantida”. A incorporadora deu início à utilização do formato no interior de São Paulo e pretende expandilo para todas as suas regionais no período de um ano a um ano e meio.
Atualmente, o financiamento de 90% das vendas da MRV no formato SICAQ/SAC ocorre até 120 dias após a assinatura do contrato da incorporadora com o cliente. “Em alguns casos, o banco pode não conceder o financiamento definitivo, ou o cliente desiste da compra”, diz o copresidente da MRV Rafael Menin. Segundo ele, no SICAQ/SAC, a parcela de distratos registrada pela incorporadora é de 12% a 16% das vendas brutas.
Menin espera que, com a venda garantida, o financiamento continue a ocorrer de 90 a 120 dias após a definição da compra pelo cliente. A contabilização da venda será postergada em três meses, por ser registrada só no repasse, mas o copresidente da MRV ressalta que deixa de haver risco de distrato. “Passamos a ter ganho de produtividade, e nossas despesas comerciais ficam menores”, diz. Menos rescisões de vendas significam também redução de processos judiciais.
Já a Tenda, que também atua no Minha Casa, Minha Vida, não pretende mudar a forma de contabilizar a venda. Segundo o diretor financeiro e de relações com investidores, Felipe Cohen, a empresa fará alteração somente se houver exigência de mudança conforme o padrão contábil IFRS ou se todos os concorrentes da Tenda adotarem o registro da venda no repasse como modelo. “O formato atual permite monitorar melhor a cadeia da venda”, afirma Cohen.
Desde o terceiro trimestre do ano passado, a Tenda passou a “forçar distratos” quando o prazo entre a venda de uma unidade e o repasse ultrapassa três meses, de acordo com o diretor de relações com investidores. Com isso, o patamar de rescisões da companhia aumentou em relação às vendas brutas. “A expectativa é concluir esse processo nos próximos trimestres”, afirma Cohen.