Arquitetos e engenheiros defendem um “SUS da habitação social”

Arquitetos e engenheiros, unidos, lançaram hoje (15/08/18) um chamamento para que a assistência técnica gratuita para o projeto, reforma ou construção de habitações de interesse social, já prevista em legislação de 2008, “seja mais do que uma lei, seja uma Política de Estado, como parte do direito social à moradia previsto na Constituição”, conforme afirmou o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), Luciano Guimarães.

O apelo foi feito durante o Seminário de Assistência Técnica em Habitação Social que o CAU/BR e o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) promovem em Brasília. Se o apelo for atendido, o Brasil passaria a ter, na área da moradia social, o equivalente ao SUS na área da Saúde, independente de programas de governos.

No Brasil mais de 85% da população, segundo o DataFolha, constrói ou reforma suas casas sem qualquer ajuda de arquitetos ou engenheiros, profissionais legalmente habilitados para realizar projetos e obras. Em consequência, temos a péssima qualidade das construções que se observa nas periferias de todas as grandes cidades do país, causando problemas de saúde e piorando a qualidade de vida da população.

A lei 11.888/2008, que completa dez anos em dezembro, atenderia parte do problema, mas “a lei por si não é condição de sucesso”, segundo Edson Delgado, vice-presidente do CONFEA, com o que concordou o secretário-executivo do Ministério das Cidades, Silvani Alves Pereira. Para ele, “essa questão exige a mobilização de entidades de classe e da sociedade em geral”.

Incluídos no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal, os projetos para prestação de assistência técnica (ATHIS) apresentaram uma “taxa de mortalidade” bem acima da média das demais modalidades de soluções para moradia para população de baixa renda. Foi o que informou a arquiteta e urbanista Mirna Quinderé Belmiro Chaves, diretora do Departamento de Melhoria Habitacional, da Secretaria Nacional de Habitação, do Ministério das Cidades.

Dos 903 projetos ATHIS selecionados, 730 foram cancelados, ou seja, 81%. Em valores, dos R$ 118 milhões empenhados, foram usados apenas R$ 78 milhões, o que equivale a 66%. A média de cancelamento, considerando todas as modalidades, é de 38% em quantidade de projetos e 32% em recursos financeiros.

Uma das causas, segundo a arquiteta, é a falta de condições dos beneficiários para pagar mão de obra e materiais. Para atenuar o problema, o governo criou em novembro de 2016, o Cartão Reforma, que subsidia em até R$ 9.646,07 a aquisição de materiais de construção para famílias com renda de até R$ 2.811,00, destinados à reforma, à ampliação ou à conclusão de unidades habitacionais. Um total de 151 municípios, em 24 estados, já são abrangidos pelo Cartão Reforma, beneficiando 26 mil famílias e envolvendo R$ 149 milhões de recursos. “Os resultados, contudo, estão aquém dos esperados, e em breve anunciaremos reformulações para facilitar o acesso ao programa”, afirmou Mirna Quinderé Belmiro Chaves.

As Prefeituras que aderem ao Cartão Reforma podem receber até 15% do valor total de materiais em Assistência Técnica, mas a experiência realizada até agora tem apresentado problemas. Em razão disso, entre uma das mudanças a serem implantadas é a flexibilização do modelo de repasse dos recursos da União, de forma a que Municípios, o Distrito Federal e os Estados possam instituir uma prestação continuada dos serviços de assistência técnica, não apenas atender a projetos pontuais.

Um dos resultados esperados do Seminário são propostas para um modelo nacional de assistência técnica em habitação social, nos moldes da Lei 11.888/2008, para ser aplicado pelo Ministério das Cidades em 200 cidades brasileiras.

O projeto que deu origem à lei 11.888/2008 foi apresentada na Câmara, pela primeira vez, pelo arquiteto e urbanista Clóvis Ilgenfritz em 2002, quando foi deputado federal, baseado em trabalho pioneiro que realizou na década de 70 em Porto Alegre, o Programa de Assistência Técnica à Moradia Econômica, que uniu esforços da Prefeitura e do Sindicato dos Arquitetos gaúchos.

Quatro anos depois, na legislatura seguinte, seu colega também arquiteto e urbanista Zezéu Ribeiro, e também deputado, reapresentou o projeto, que depois virou a Lei 11.888/2008. “O objetivo da lei não é apenas produzir unidades habitacionais, mas sim produzir cidades mais estruturadas e melhores através da habitação”, lembra Luciano Guimarães, presidente do CAU/BR.

Fonte: Exame