Empresários temem novo freio na economia e fim das reformas

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A implicação do presidente Michel Temer nas delações do empresário Joesley Batista, da JBS, despertou entre os empresários o temor de uma nova trava na incipiente recuperação da economia brasileira, a paralisação do processo de retomada dos investimentos e a paralisação das reformas ­ da Previdência e trabalhista ­ que tramitam no Congresso.

Em reação ao episódio, o presidente do Grupo Pão de Açúcar, Ronaldo Iabrudi, encaminhou ontem carta para cerca de cem executivos da companhia alertando para a “crise grave” que o país enfrenta. Ele afirma que a situação não pode abalar “o foco no cliente”.

A análise interna da empresa é que o consumo pode sofrer um abalo temporário maior, por conta do efeito da piora dos ânimos do mercado e do consumidor. Mas isso não deve contaminar de maneira tão profunda a lenta e gradual recuperação na demanda, disse.

A situação para as empresas brasileiras, que vinha se desenhando em torno das expectativas de que o cenário poderia melhorar no segundo semestre, agora volta a um estágio de enorme pessimismo e incerteza, que paralisa os investimentos e as reformas, disse Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).

“Ainda não sabemos a extensão desses fatos, mas uma coisa é certa: perdemos a sustentação. O cenário é muito ruim para as companhias sem as medidas que vinham caminhando para serem aprovadas, com a paralisação da economia e em meio a uma maior aversão por causa das incertezas quanto ao futuro do governo e do Brasil”, disse.

Para Oliveira, a decisão “menos traumática” nesse momento seria Temer renunciar, o que o presidente sinalizou, por enquanto, que não irá fazer. Para ele, a queda da taxa básica também está ameaçada.

Falando pela manhã, antes da divulgação de parte dos áudios, o empresário Josué Gomes da Silva, dono da Coteminas e filho do ex­vice­presidente José Alencar, defendeu a “quebra do sigilo” das gravações. Para o empresário, ainda é prematuro fazer avaliações mais profundas pela ausência das informações completas.

“Apesar de toda turbulência, o Brasil não vai acabar. É um país grande e rico, capaz de gerar muita prosperidade ainda”, disse.

O presidente executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas, Eduardo Lucano, disse que a nova fase da crise “paralisa” o processo de melhora da economia. “Havia um horizonte de reformas, de política fiscal mais equilibrada, que estava apresentando uma certa tendencia a estabilização”, disse. Um novo fator de desestabilização deve levar à revisão de posições e investimentos, argumentou.

Se confirmado o conteúdo da delação, uma das principais preocupações será quanto à eficiência dos órgãos reguladores de companhias abertas e dos controles das próprias empresas, disse o presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), Mauro Rodrigues da Cunha.

“Se as denúncias forem confirmadas, a pergunta é: como podem empresas de capital aberto e que têm, portanto, obrigações e supervisões adicionais, pagarem propina com essa facilidade e terem negociado no balcão da política dessa forma?”, questionou. A JBS tem ações listadas no Brasil e prepara abertura de capital no exterior.

Para Fernando Figueiredo, presidente­executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), a permanência de Michel Temer (PMDB) na Presidência se tornará insustentável se as denúncias se confirmarem. Para ele, um nome alternativo ao comando do país, até que se realizem as eleições de 2018, seria o do presidente da Petrobras, Pedro Parente.

Uma potencial queda de Michel Temer, segundo Figueiredo, poderá ter impacto de curtíssimo prazo no andamento das reformas. “As reformas são imprescindíveis e não são de Temer. São reformas necessárias ao país. A expectativa é que o Congresso saberá continuar no caminho certo”, acrescentou.

O presidente da Tecnisa, Meyer Nigri, avalia que incorporadoras focadas nas rendas média e média­alta e consumidores ficarão em compasso de espera na tomada de decisões de investimento após o acirramento da crise política. Para Nigri, Temer continuará como presidente. “Não acredito que ele irá renunciar”, disse. Já a votação das reformas será paralisada.

O acirramento da crise política não terá impacto imediato sobre a decisão de lançamentos imobiliários pelas incorporadoras, mas terá efeito nas vendas nos próximos dias, na avaliação do presidente do Secovi­SP, o Sindicato da Habitação, Flávio Amary.

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, fez um apelo para que a crise política se resolva “no menor tempo possível” e que o Congresso Nacional mantenha seus planos de votar a reforma da Previdência. Para ele, a votação pode ocorrer mesmo com um governo acéfalo e sem outra agenda legislativa. “O Congresso, tão desacreditado como está, precisa assumir essa responsabilidade. Parece loucura minha, mas o relatório está pronto e talvez os parlamentares tenham agora uma oportunidade de ouro para dar respostas à sociedade”. Martins evitou se posicionar sobre a continuidade ou saída de Temer.

A piora da crise exige a tomada rápida de decisões pelos três poderes e transparência na divulgação dos fatos, defendeu o presidente­executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelso Mussolini.

Para ele, se a permanência de Temer se mostrar impraticável, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, seria boa opção ao cargo.

O presidente da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp), Francisco Balestrin, acredita que os investidores estrangeiros tendem a paralisar seus aportes no Brasil até entender os reflexos das denúncias nas reformas trabalhistas e da Previdência.

A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) cobra responsabilidade e equilíbrio do Congresso para superar a instabilidade política. “Nesse momento não há como tramitar coisa alguma. O Congresso precisa ter o compromisso com o país acima da disputa política. Não há nenhum ganhador em um momento em que o país se deteriora tanto”, afirmou o presidente da Abit, Fernando Valente Pimentel.

A Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) disse em nota que, independentemente do que ocorrer na Presidência após as denúncias contra Michel Temer, o Congresso deve dar prosseguimento à agenda de reformas. A entidade pede andamento na medida provisória (MP) do Programa de Recuperação Tributária (Refis).

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Walter Cover, avalia que os investimentos previstos pelo setor serão mantidos após as denúncias contra o presidente da República, Michel Temer. “O que pode ser afetado são os investimentos que ainda não estão na pauta das empresas”, disse.

Fonte: Valor Econômico