Maior programa habitacional do país, o “Minha Casa, Minha Vida” possui mais de 40 mil unidades habitacionais com obras paradas, seja por falta de recurso, problemas com a construtora, falta de obra complementar ou mesmo invasões aos imóveis. A situação faz com que moradores de baixa renda sigam pagando aluguel ou vivendo em áreas de risco.
Segundo dados obtidos pelo UOL junto ao Ministério das Cidades, a faixa 1 –que inclui pessoas com renda familiar de até R$1.800, que têm a construção bancada pelo poder público– tem 279 empreendimentos paralisados pelo país, o que significa 40.990 unidades habitacionais.
O programa “Minha Casa, Minha Vida” foi lançado em março de 2009 e, desde lá, construiu 5,2 milhões de unidades habitacionais. Dessas, o Ministério das Cidades afirma que quase 4 milhões foram entregues. Diz também que o número de obras paradas era maior e vem caindo, porém ainda é considerado um problema.
“O dinheiro do auxílio-moradia não dá: não existe aluguel nesse preço”
Um exemplo do problema está em Olinda, na Grande Recife, onde os residenciais de Peixinhos 1 e 2 estão abandonados, mesmo após 95% da obra concluída. A construção foi iniciada em março de 2014, com entrega prevista para março de 2016 às 720 famílias contempladas. A nova previsão de entrega é o final deste ano.
O local hoje está com prédios concluídos, mas à espera de obras complementares para serem entregues. Por conta do tempo em que a construção esteve parada, o local já apresenta marcas do descaso, como casa de máquina abandonada, esgoto a céu aberto e janelas quebradas.
Os contratos com os beneficiários foram assinados em dezembro de 2017. Um deles é Alexandre Moura Cavalcante, 44. Ele conta que aguarda há sete anos por uma casa prometida, após aquela em que vivia ser desapropriada pela prefeitura para uma obra pública. “Minha casa e a de mais 134 foram derrubadas na época. Prometeram dar um apartamento desses [do residencial Peixinhos] e estamos nessa espera sem fim”, afirma.
Hoje, ele, a mulher e os três filhos pagam R$ 450 por mês de aluguel. Entretanto, ele recebe um auxílio-moradia de R$ 200 e precisa complementar o valor. “O dinheiro não dá, não existe aluguel nesse preço. Moro na mesma rua em que morava antes. Estou aqui nesse bairro há 40 anos e quero muito me mudar”, diz.
Líder de um movimento social que teve direito a 230 imóveis, Silas Durack afirma que muitas famílias vivem em condições precárias. “Enquanto não entregam, muitos seguem vivendo em áreas de risco, na beira de encostas. É um tratamento com desleixo do estado”, afirma.
Em nota enviada ao UOL, a Companhia Estadual de Habitação informou que, apesar dos imóveis estarem prontos, eles só podem ser entregues após o fim das obras das vias de acesso e da estação elevatória de esgoto.
O maior problema no caso dos residenciais Peixinhos seria o esgoto. “A obra da estação elevatória de esgoto está sendo licitada novamente porque a Secretaria de Habitação teve um problema com a empresa responsável, mas o problema já está sendo resolvido”, continua o comunicado.
Obras paradas por todos país
Obras paradas do “Minha Casa, Minha Vida” estão espalhadas por todas as regiões do país. Em Bauru (SP), por exemplo, a construção do residencial Manacás está parado pelo abandono da construtora responsável.
Em Londrina (PR), o residencial Flores do Campo teve problemas com uma ocupação ainda em outubro de 2016, enquanto o Alegro Villagio está com obras paralisadas.
Situação parecida em Alexânia (GO), na região metropolitana do Distrito Federal, onde um conjunto com obras paradas foi ocupado e segue com moradia irregular
Já em Parnamirim, na Grande Natal, dois empreendimentos para 1.264 unidades que começaram a ser erguidos em 2012 estão abandonados após construtoras desistirem das obras.
Ações contra atrasos
O secretário-executivo do Ministério das Cidades, Silvani Pereira, afirmou ao UOL que o número de obras paradas vem caindo nos últimos dois anos, mas ainda é alto e considerado um problema. “Tínhamos há dois anos 95 mil unidades, já retomamos várias. Asseguramos nessas retomadas um fluxo de pagamento correto para que a obra tenha uma normalidade e evitar novos problemas”, explica.
Pereira conta que os atrasos podem ocorrer por vários motivos, que vão desde o não repasse da contrapartida de estado ou município, não realização de obras complementares (como vias de acesso e esgoto) e até saída da obra por problemas burocráticos e/ou financeiros.
“Às vezes falta a companhia de energia ou de água colocar uma infraestrutura. Estamos mitigando isso. Temos agora um grupo permanente que avalia essas obras, empreendimento por empreendimento”, diz.
O secretário falou ainda que os novos contratos estão sendo fechados com algumas mudanças, como a exigência de pagamento da contrapartida do ente (estado ou município) no ato da contratação, e não mais no fim da obra.
Outra novidade deve ser a implantação do seguro de plano de obra, que deve garantir a execução no prazo dos empreendimentos, com seguimento imediato da obra em caso de problemas com a construtora.
“Isso já está em estudo; estamos dimensionando o custo porque não podemos onerar muito o imóvel. O que temos expectativa de lançar esse ano é o seguro qualidade, que fará uma avaliação para saber se o que foi programado está sendo entregue, se há erro de projeto, se o material usado foi inadequado. Com isso teremos um acompanhamento muito mais próximo e acreditamos que também vai impactar no correto fluxo da obra”, afirma, citando que esse seguro-qualidade vai encarecer entre 1 e 1,5% o custo do imóvel.