Marcha Nacional pelo Direito à Cidade terminou com conquista dos movimentos
Na última semana diversos movimentos nacionais de defesa da moradia estiveram reunidos em Brasília para a Marcha Nacional pelo Direito à Cidade. A Comissão de Desenvolvimento Urbano (CDU) acompanhou as atividades das entidades, intermediou as demandas dos movimentos junto ao Ministério das Cidades, e promoveu audiência pública com o ministro das Cidades, Alexandre Baldy, para que os participantes da Marcha pudessem apresentar as principais preocupações quanto às pautas de habitação, saneamento e mobilidade urbana.
Na terça-feira (5/6), a Comissão acompanhou a marcha realizada pelas entidades na Esplanada dos Ministérios. Entre as reivindicações estiveram a retomada da construção da política nacional de habitação e dos investimentos no Minha Casa Minha Vida-Entidades; a retomada dos investimentos em saneamento e mobilidade; a realização da VI Conferência Nacional das Cidades em 2018; e a retomada imediata do Conselho Nacional das Cidades.
A Marcha Nacional foi organizada de 5 a 7 de junho pelo Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM), Confederação Nacional de Associações de Moradores (Conam), União Nacional por Moradia Popular (UNMP), Movimento de Luta de Bairros e Favelas (MLB), Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) e Central dos Movimentos Populares (CMP).
Audiência pública
No dia 6/6, as entidades estiveram reunidas, junto com parlamentares, na audiência pública promovida pela CDU com o ministro das Cidades, Alexandre Baldy. Em sua exposição, o ministro fez uma breve apresentação sobre os projetos e as atribuições do Ministério das Cidades e, em seguida, ouviu as manifestações de parlamentares e representantes dos movimentos de moradia, especialmente nas questões dos novos investimentos para o Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), e demais programas sociais e políticas públicas de competência do Ministério.
Conferência e Conselho Nacional das Cidades
Um dos principais assuntos tratados na audiência foi a retomada do Conselho e a realização da Conferência das Cidades. Sobre o Conselho, tanto deputados como entidades reforçaram ser um espaço democrático fundamental para debater mais profundamente os temas ligados à cidade, bem como resolver os conflitos urbanos junto com os interlocutores do governo.
O Deputado Givaldo Vieira (PCdoB/ES) considerou de extrema importância a reafirmação da democracia no âmbito do desenvolvimento urbano e do Ministério das Cidades. Ele criticou a protelação da Conferência das Cidades e o encerramento do mandato de seus conselheiros. Sobre a resposta do Ministério, relembrou a promessa do governo em retomar as ações no ano de 2017.
Os representantes dos movimentos de moradia defenderem a convocação imediata do Conselho das Cidades e da Conferência Nacional das Cidades, avaliando serem fóruns privilegiados para a manifestação da população e a gestão democrática. “Historicamente o Conselho nasceu com o próprio Ministério e conseguiu, nos últimos 15 anos, avançar muito em soluções, programas e ações”, disse Getúlio Vargas, da Confederação Nacional de Associações de Moradores (Conam). Ele também expôs ao ministro a necessidade de focar em uma política nacional integrada de desenvolvimento urbano para habitação, mobilidade, saneamento, e cobrou do governo uma interlocução qualificada, não apenas com os movimentos, mas com o conjunto do Conselho das Cidades.
O Deputado Paulo Teixeira (PT/SP), representando a liderança da minoria no Congresso, lembrou que o Ministério das Cidades, quando de sua criação, foi responsável por investir bilhões nas cidades brasileiras, além de ter criado o PMCMV. Ele criticou o fato de o governo ter acabado com a Conferência e com o Conselho das Cidades, taxando a situação como “quebra no sistema de participação popular”. O parlamentar também fez um apelo ao ministro para estabelecer, junto aos movimentos, uma agenda de atendimento às pautas mais urgentes do setor.
Programa Minha Casa, Minha Vida
Em relação ao Programa MCMV, o Deputado Caetano (PT/BA) fez um alerta. “Os conjuntos habitacionais estão ficando desertos. Faltam creches, postos de saúde e escolas. O social ficou muito a desejar nos conjuntos habitacionais. Deveria ter um olhar maior e mais profundo do governo e do Ministério para essa questão”.
As entidades presentes questionaram os diversos cortes no orçamento, que prejudicam o alcance das metas em várias áreas sociais e aumentam as desigualdades sociais. Nesse sentido, lembram da necessidade de o Ministério dar continuidade às novas contratações do PMCMV, na modalidade Entidades, e também cobraram medidas mais urgentes e diretas para mitigar os problemas atuais das políticas urbanas.
Para Edmilson Rodrigues (PSOL/PA), o congelamento de gastos primários (Emenda Constitucional nº 95/16) também afeta sobremaneira a condução dos trabalhos na área social e urbana, inviabilizando o desenvolvimento do país. “Não há recurso para investimento em infraestrutura de saneamento, por exemplo, num país com uma carência enorme”, lembrou.
Ocupações urbanas e déficit habitacional
A questão urgente das ocupações urbanas foi levantada pelos movimentos, principalmente após o incêndio no Edifício Wilton Paes de Almeida em SP. Eles pediram mais atenção do Ministério das Cidades para esses problemas e criticaram o fato de o maior investimento no PMCMV não ser na Faixa 1 (que atende ao público de baixa renda), para moradia de interesse social. Raimundo Bomfim, da CMP, questionou os diversos cortes no orçamento, que prejudicam o alcance das metas em várias áreas sociais e aumentam as desigualdades sociais. “É preciso revogar o congelamento de recursos nas áreas sociais para que possamos voltar a aplicar as políticas públicas nas cidades”.
Eles ainda reforçaram a luta contra os projetos de criminalização dos movimentos sociais. “Corriqueiramente acontecem acidentes nas ocupações, incêndios, desabamentos, inundações. É preciso fortalecer o debate no âmbito do Ministério e do Conselho das Cidades”, ressaltou Wellington Bernardo, do Movimento de Luta de Bairros e Favelas (MLB). Para Francisco Dorion do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD), “se o governo tivesse uma política efetiva de destinação dos imóveis desocupados, e se o Conselho e a Conferência estivessem em vigor, com certeza seria possível ter um diálogo mais célere”.
Saneamento
Na área de saneamento, o Deputado João Paulo Papa (PSDB/SP) revelou a preocupação atual do setor em relação à ideia do governo federal de alteração do marco legal do saneamento. Papa considera que o dispositivo obriga que todas as renovações de contrato estabelecido de governo para governo sejam repassadas para o setor privado. “Um dispositivo como esse desorganiza o setor de saneamento, ao invés de impulsiona-lo”, disse.
Os movimentos também se posicionaram contra a proposta de saneamento do Ministério das Cidades. Na avaliação do representante do Movimento Nacional de Luta por Moradia, Miguel Lobato, é um projeto de privatização da política de saneamento e não uma proposta de ajuste para as cidades. A análise foi corroborada também por Cláudio Pereira, da UNMP, e os demais movimentos citados anteriormente.
Para o Deputado Miguel Haddad (PSDB/SP) há uma grande dificuldade econômica nos estados, na União e, em especial, nos municípios. Ele disse ser preciso investir e estimular cada vez mais gestões de qualidade. “É essencial que o Ministério possa criar condições e estimular soluções regionais. As soluções hoje não são mais individuais, nós só podemos avançar efetivamente quando tivermos uma ação conjunta”.
Demandas atendidas
Após os diálogos intermediados pela CDU na audiência pública, o ministro, Alexandre Baldy se reuniu com os participantes da Marcha Nacional pelo Direito à Cidade para ouvir as reivindicações e estabelecer os encaminhamentos necessários sobre a pauta. Atendendo os pedidos dos movimentos, o ministro anunciou a publicação de portaria para regulamentar o processo de seleção de propostas para novas contratações do Programa Minha Casa, Minha Vida – Entidades (PMCMV-E). O documento foi publicado no último dia 8 de junho no Diário Oficial da União.
Sobre a Conferência Nacional das Cidades e a retomada do Conselho Nacional das Cidades, após ser novamente questionado pelos movimentos, Baldy afirmou ser interesse da Pasta realizar o evento ainda este ano, e garantiu que será realizada reunião em agosto para definir os rumos da VI Conferência e a formação do novo Conselho Nacional das Cidades.
A Deputada Margarida Salomão, presidenta da CDU, destacou que os encontros e debates com o ministro possibilitaram aos movimentos uma conquista em temas que precisavam de uma deliberação urgente por parte do Ministério. “A Comissão procurou mediar os debates diretamente com os movimentos e o ministro, a fim de garantir o atendimento de pautas tão sensíveis como são os programas de moradia, a regularização fundiária, o saneamento, e demais ações de desenvolvimento urbano”.